Aqui está a tradução de uma das partes da matéria com Madonna para a revista MOJO, em que ela fala do começo de carreira, do novo álbum “Rebel Heart” e sobre a canção “Devil Pray”, cujo tema é sobre drogas. Confira:
Com fogo nos olhos e um coração sensível, ela ascendeu da cena pós-punk baladeira de Nova York com visões lúcidas da música que ela DEVERIA fazer. Depois de 13 álbuns, Madonna e seus principais colaboradores contam tudo sobre as decisões musicais e as confissões líricas que a levaram de Pontiac, Michigan, para o Mundo, sempre com a maior modernidade do Pop. “Tem sido bem intenso…e complicado”, ela contou.
1982: sob as luzes da boate na rua West, 30, na 21ª rua de Nova York, Madonna Louise Ciccone está perdida na música. Dentro deste refúgio notívago de quatro andares, a trilha-sonora é tão eclética quanto os baladeiros ao redor dela. Desajustados e forasteiros dançam juntos a tudo: de James Brown a PiL, de Grace Jones a The Pop Group, de Afrika Bambaataa a Arthur Russell.
Entre as baristas, estão Helen Folusade Adu – que logo se tornaria famosa como Sade – e a artista excêntrica Karen Finley, além dos adolescentes Beastie Boys, trabalhando como motoristas de ônibus, e limpando cinzeiros e mesas. O recém-amigo de Ciccone, Keith Haring, que durante o dia pinta murais com figuras coloridas e cheias de movimento, trabalha no vestiário à noite. O futuro amante Jean-Michel Basquiat furtivamente pinta sua marca SAMO nos muros da boate. A marca de Madonna é caracteristicamente provocante e se chama Boy Toy.
“Nova York estava viva e incrível”, ela admira. “Era o que tínhamos à época. Eu estava rodeada de grandes artistas.”
É aqui, nesta colmeia de pensamento criativo e atividade, que a visão musical de Madonna cintilou pela primeira vez. Até este ponto, as bandas se aventuravam e havia uma estadia de cinco meses em Paris, em 1979, como convite de dois produtores belgas, trabalhando com o cantor Disco francês Patrick Hernandez. Mas essas experiências, apesar de educacionais, só resultaram em frustrações. Agora, na pista de dança, estudando a Club Music quase como ciência, ela consegue enxergar um caminho aberto.
“Todos os meus amigos eram DJs,”, ela disse, “então eu quis que minhas músicas soassem como algo pra me fazer dançar. Eu ia às boates e ouvia o que me fizesse dançar, entende? Daí, eu voltava e trabalhava em minha música. Sabe, Debbie Harry, Talking Heads, The B-52s…todos me inspiravam. Então, pra mim, era tudo confuso: o que eu estava trabalhando e o que me fazia dançar.”
Uma noite, Madonna foi até o DJ Mark Kamins com uma fita cassete de uma demo chamada Everybody, uma faixa cheia de sintetizadores, com Madonna lhe chamando pra dançar. Kamins ouviu a faixa em casa e, impressionado, começou a tocá-la na noite seguinte.
“Eu estava na cabine do DJ”, lembra Madonna, com aquele famoso sorriso iluminado no rosto. “Eu achei maravilhosa (risos)”. Foi a primeira vez que esta dançarina/cantora/produtora presenciou o efeito da música dela na multidão. “Ser capaz de fazer as pessoas dançarem com a sua música…”, ela se emociona. “É um momento mágico”.
Seis ruas ao norte, cinco blocos a oeste, 32 anos depois. Tudo e, de certa forma, nada mudou pra Madonna. O negócio dela permanece roubando o som das pistas e levando-os às rádios e às paradas. Na sala de controle do estúdio Jungle City, uma surpreendente loja de bijuterias cujos antigos ocupantes incluem Beyoncé, Jay-Z e Alicia Keys, ela está entre enormes alto-falantes, usando um vestido floral à la anos 40, bebendo champanhe e ouvindo faixas do 13º álbum, Rebel Heart. O volume está violentamente alto.
“Sim!”, ela zomba, “É alto mesmo! Tem que ser alto. Sem censura. Gosto de sentir que estou levando um chute no estômago quando toco música ou quando faço música”. Se é assim, a gente se pergunta como está a audição dela hoje em dia? “Está muito boa. Estranhamente boa”.
Uma versão crua de Rebel Heart, a confessional faixa-título com violões acústicos vazou no fim do ano passado, apesar de Madonna estar levando numa boa. “Você quer ouvir a verdadeira versão?”, pergunta ela. Menos de uma semana depois, entretanto, quando outras 10 canções não-finalizadas foram distribuídas, ela alegou ser um “estupro artístico”, o que levou a uma pré-venda oficial de seis faixas no iTunes. Daí, no dia de Natal, outras 14 apareceram na rede.
É fácil entender por que Madonna está furiosa com esta violação repugnante. Apesar dela sempre ter buscado o estrelato, ela manteve a sensibilidade típica do compositor, artista e produtor; e, hoje, ao expor suas novas canções pela primeira vez, ela o faz sem compromisso. A revista MOJO ouviu suas versões do single de retorno, Living For Love – a primeira remontando ao estilo Deep House de 1989, e a segunda com camadas de sintetizadores de EDM. Perguntados por Madonna qual nós preferimos, escolhemos a primeira e recebemos um abraço como prêmio: “É a minha favorita também”, disparou ela. “É boa pra caralho!”.
A lista de créditos dos álbuns recentes de Madonna tipicamente apresenta um elenco com os melhores produtores do momento. Rebel Heart se gaba com contribuições de Diplo, Kanye West e Avicii, levando, talvez, à impressão de que eles são meramente uma combinação para construir a marca de Madonna. Porém, ao conversar com qualquer profissional envolvido na música de Madonna, do passado ou presente, eles te contarão uma história diferente.
A cantora arregaça as mangas e trabalha por várias horas no estúdio, com uma direção musical clara na mente. Rebel Heart, gravado em Nova York, Londres e Los Angeles, tem estado em produção por nove meses: a sessão mais longa e mais intensa que Madonna já teve.
“Não me lembro de cada experiência de gravação”, ela disse. “Parece que já tive muitas. Mas esta tem sido bem intensa…e complicada. Apenas porque há tantos envolvidos. E sempre que alguém se junta à equipe, eles trazem um novo sabor. Daí, eu tenho que dar um passo pra trás e definir: ‘OK, como isso tudo se encaixa aqui?’. Então, parece nunca ter fim.”
Atualmente, há 16 faixas em vários estágios de finalização. Ela hesita quando pensa em como irá terminá-las: “Tenho medo deste momento”. As 14 faixas tocadas para a revista MOJO pertencem a dois contextos: desilusão amorosa e vulnerabilidade (Joan Of Arc, Ghosttown) e rebeldia (Bitch, I’m Madonna, Unapologetic Bitch), enquanto outras combinam estas emoções conflitantes (Heartbreak City, Wash All Over Me).
A própria Madonna titubeia quando tenta descrever as novas canções: “Sinto que…elas parecem uma manifestação de dois lados meus que…sei lá… que se mostram bem claros em minhas composições.” Que são…provocantes? “Mm, sim!”. E sobre ser mais emotiva do que racional? “Sim, romântica. E renegada.”
Enquanto isso, na combinação híbrida eletro/country de Devil Pray, Madonna entrega uma letra que parece ser evidentemente antidrogas, afirmando que elas são uma ilusão perigosa. “Sabe, não estou dizendo às pessoas para não usarem drogas”, Madonna insiste. “Estou dizendo que elas são um truque e que você precisa tomar cuidado”. No meio da canção, ela lista várias substâncias, incluindo ecstasy, maconha e até solventes. É bem estranho ouvir Madonna cantando sobre cheirar cola. “(Ela grita e bate palma) Sim, está de volta…”.
Você admite nunca ter sido usuária de drogas naturais?
“Não. Minha natureza é estar no controle da situação. Não fora dele.”
Mas você já experimentou uma epifania musical enquanto quimicamente alterada?
“Eu não diria que tive epifanias musicais, mas que só tive…epifanias, nas quais tudo parecia estar melhor do que realmente estava (risos). Mas meu problema é que não tenho atitude pra me drogar. Me sinto terrível depois e fico destruída por vários dias. Não consigo fazer nada, e não quero essa inconveniência em minha vida. Então, acho que não vale a pena. Mas essa sou eu…”
Depois da calmaria, vem a tormenta.
“Isso. Até quando eu era mais jovem e tinha 20 anos, experimentando isso e aquilo… Sabe, nunca fui de me drogar muito. Sou muito covarde. Além disso, sou dançarina e não quero destruir meu corpo. Então, nunca foi natural pra mim ficar inconsciente ou tão chapada que não conseguia levantar da cada por vários dias. E era isso que acontecia se eu tomasse qualquer coisa.”
A melhor experiência com drogas, então?
“Devo dizer que a melhor que tive foi quando tomei morfina em um hospital (risos), quando fiz duas cesarianas. Oh, e também quando caí do cavalo (em 2005) e quebrei 10 ossos. Tomei morfina aí também e, bem, é uma sensação maravilhosa. Mas, daí, após 24 horas, as enfermeiras param de te dar e a dor volta com tudo. Então, esta é provavelmente a coisa mais legal que já experimentei em termos de drogas. Eram ordens do médico, mas eu entendi como as pessoas se viciam em heroína. Mortalmente.”