O que é divertido? Quando e como somos felizes? A despeito daqueles momentos irrefutáveis em que a alegria ou o êxtase acontecem e podemos absorver e depreender tudo o que a experiência proporciona ou, mais simples, curtimos e ponto final, há aquilo que reconhecemos como sendo “o que todo mundo faz quando quer se divertir”. O que nem sempre é divertido.
Há o orgasmo envolvente com alguém que inspire afeto, mesmo que seja o afeto instantâneo de alguém que seja apenas cúmplice em uma realização erótica. A experiência epifânica que a arte ou o instante espiritual podem produzir. É bem fácil perceber a felicidade causada por um momento divertido sonorizado por muitas risadas. Todos estes caminhos para o prazer não requerem algum estado alterado de consciência. Há prazer e oportunidades de sobra para vivenciá-lo sem que algum remédio se faça necessário. Para isso é preciso saber as respostas para as perguntas do início deste texto. E, se possível, ampliar as possibilidades das respostas ao longo da vida. Sim, a vontade de brincar pode ser a mesma mas os brinquedos mudam e devem mudar, acompanhando as fases da vida.
Aparentemente “o que todo mundo faz quando quer se divertir” deve, necessariamente, incluir pelo menos uma birita.
Para o jovem mediano do mundo inteiro a idéia de se divertir é ter uma cerveja na mão e um cigarro na outra. O cenário é um lugar cheio de mulheres com um padrão de beleza específico que tem tudo a ver com o mercado da moda. Poderíamos chamar de “padrão shopping center”, e música eletrônica bem alta ao fundo. Sexo fácil está nas entrelinhas e conversar é desnecessário: as roupas e o teor etílico fazem as apresentações e adiantam a superficial “intimidade”. Amanhã é outro dia e ninguém precisa lembrar de nada. Ficar bêbado e perder a caixa preta parece ser divertidíssimo. Pode ser, principalmente para quem assiste ao bêbado ou usufrui de seu baixíssimo senso crítico.
O barato da droga existe desde que o mundo é mundo. A necessidade de estimulantes ou anestésicos para a alma são uma constante nos hábitos, ainda que marginais, de boa parte da humanidade ao longo dos tempos. O atalho para a diversão, ou para o êxtase espiritual deveria ser instituído como margem previsível de alargamento daquilo que chamamos de saudável, uma vez que a ausência das drogas não chega a conferir sanidade e vice-versa. A saúde pode correr riscos, principalmente a mental, mas não há mesmo argumentos para que se proíba algumas coisas e o álcool continue sendo consumido em quantidades industriais por gente que, a despeito de ter saído pra se divertir, volta infeliz para casa. Ou que fica infeliz em casa e de lata cheia.
Compreendendo que aqui não fica nenhum julgamento moral ou incentivo ao preconceito ou proibição ao que quer que seja, podemos tentar dar uma olhada de perto no que acontece com o doidão.
O primeiro porre, o primeiro cigarro, o primeiro baseado, seja qual for a opção, há de provocar náuseas e um terrível mal estar. Não dá pra dizer que seja um início agradável para a maioria, na maior parte das vezes. E, no entanto, há um esforço juvenil para repetir o que de início não foi bem.
Oras, uma primeira trepada ruim também não há de fazer com que se desista da vida sexual. Entre estas experiências e o sexo, porém, há uma evidente discrepância: o sexo parece ser fundamental para uma vida feliz enquanto que as outras coisas são perfeitamente dispensáveis. Este esforço se dá em nome de quê?
Se a comida que você come melhora com excessos de ketchup – se a pessoa que você come só fica apetecível a partir de uma determinada dose – seu gosto ou critério podem não estar muito afinados. Sua consciência faz mal ao seu corpo? Há que se avaliar se este é um fardo que você quer mesmo carregar ou é só o que lhe foi indicado como fonte de prazer e que não tem resultado em felicidade.
O problema é avaliar estas coisas partindo de uma perspectiva que não seja a da sobriedade e consciência, maturidade e equilíbrio. Dizia o poeta: “ah, se a juventude soubesse e se a velhice pudesse…”. Não dá pra avaliar o quão genuína é a própria alegria a não ser que se esteja realmente alegre.
Refletir sobre a própria bebedeira exige sobriedade. As opções, todas, requerem auto-conhecimento e tudo o que impulsiona para a superficialidade o evita.
O moleque dá uns tapas numa bagana e começa a emburrecer vertiginosamente. Até que se habitue com a lombra, há de ser assim. Fuma um pouco e fica perplexo com qualquer coisa. É espantoso! Olha para um azulejo e acha aquilo a coisa mais incrível do mundo. Como é que tiveram aquela sacada! Deve ser difícil pra caramba fazer um azulejo. E é capaz de tecer teorias incríveis sobre a existência daquilo que vê como o símbolo mágico da arquitetura moderna. Tudo fruto da sua repentina burrice. Para o chapadão o mundo o deixa perplexo assim como para quem tomou um ácido a parede pode parecer que é de gelatina e se mexe de uma forma muito curiosa, parecendo dançar.
Insinua-se interessante o passeio nos jardins da insanidade, uma vez que a viagem é curta. Há pra mim, no entanto, a evidência das escolhas: eu não quero me sentir burro e nem louco. Ainda que eu tenha certeza de que o mundo pareça fabuloso para quem está beirando a loucura. Ainda que eu saiba que pode ser curioso olhar o mundo do ponto de vista de quem é uma besta. Prefiro vasculhar outros sentimentos, sensações e temas. A burrice artificial e temporária não exercem sobre mim nenhum fascínio. Conheço brinquedos melhores do que sentir a importância de ser uma ameba.
O que é divertido? Como e quando somos felizes? Prefiro pensar nisso.
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