Crítica: Chamar Madonna de relevante virou seu maior elogio

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Falar de Madonna à mesa de jantar a fará parecer ridícula. “Relevante” parece ser o último elogio que as pessoas têm dado a ela ultimamente. O crítico comum a elogiará pelo que ela costumava ser, mas vai desdenhar por ela permanecer na cultura Pop. As razões deste desprezo rondam os 56 anos dela e a crença de que ela está desesperada para continuar o que vem fazendo há mais de 30 anos.

Ironicamente, considerando a atitude aparente, há partes que querem novas músicas de Madonna no mundo antes delas estarem prontas. O lançamento do 13º álbum de estúdio Rebel Heart será lembrado pelos vazamentos prematuros. Mesmo antes do fim do ano passado, várias demos caíram na Internet, fazendo Madonna e equipe terminar seis faixas e disponibilizar imediatamente no iTunes. No fim, um israelita foi preso sob suspeita de invasão online, mas o álbum completo só apareceu neste mês.

Para uma artista que sempre conduziu a carreira com pulso firme, pareceu, pela primeira vez, que Madonna estava fora de controle. É interessante, a perda de controle está presente em Rebel Heart. Em Wash All Over Me, ela pergunta: “Quem sou eu para decidir o que deve ser feito?”. Parece que Madonna começou a ficar inquieta. “Se este é o fim, então deixe-o vir. Deixe-o vir, deixe chover. E me encharcar”, ela canta sob o ritmo majestoso da percussão. Liricamente, ela está mais passiva. E, em um ponto da carreira no qual a idade mostra a força, esta é uma expressão necessária de autoconhecimento; a afirmação de ser um ícone maduro neste mundo Pop tão acusador.

Ao se deixar levar, Madonna também se permite ser mais vulnerável. A exposição corre solta em Rebel Heart. Há 10 anos, ela fazia confissões bobas na pista de dança; agora, ela se confessa de um lugar mais honesto e profundo. No refrão de Joan Of Arc, ela desabafa: “Não quero falar disso agora, só me abrace enquanto eu me desfaço em lágrimas”. É um momento terno de uma mulher cuja fisicalidade, para dizer o mínimo, sugere que nada pode abatê-la. Joan Of Arc nos faz acreditar que, apesar da surpreendente complacência, a armadura dela pode ser quebrada por tudo o que dizem. Talvez, a razão de tudo seja a irrelevância e desespero: “Sempre que eles dizem algo odioso, minha alma é arrastada à sujeira. Quero morrer”. É uma confissão que parece rara, considerando a personalidade de Madonna.

O álbum anterior, MDNA (2012), foi considerado a “obra do divórcio”. As letras detalharam o drama que ela viveu ao abandonar o ex-marido Guy Ritchie. Em Rebel Heart, Madonna articula a experiência da separação de uma forma mais ampla. Sentimentos viajam da angústia ao poder encontrado no adeus. Heartbreak City é uma peça clara do material triste. “Me cortou em duas. Me destruiu um pouco”, ela treme sob um piano infeliz, intensificado por outra marcha percussiva. É notável, a marcha é o som da resistência em Rebel Heart, e os fãs vão seguindo os passos da sobrevivência de Madonna ao longo do álbum.

Da força que ela encontra na perseverança, manifesta-se Living For Love, como o single principal do álbum. A sequência House do produtor Diplo aumenta a energia como os hinos Like A Prayer e Express Yourself. Há também uma dualidade no contexto da canção: a vida após o amor. A mensagem secundária é fazer do amor a razão da vida. E, por esta razão, é fácil imaginar as pessoas ao redor do mundo elevando Living For Love a um patamar de hino mais do que a canção já representa.

O lado oposto da perda do amor de Madonna é a eterna afinidade com a idealização romântica. Esta contemplação ganha bastante espaço em Ghosttown, na qual a perspectiva é deslumbrada, com a narração de um conto de sobrevivência do amor em um mundo pós-apocalíptico. Enfeitado com um refrão distante, Ghosttown é uma balada eletrônica com melodias profundas e curvas. Apesar de um pouco de auto-tune, a voz de Madonna soa completa e mais verdadeira. Por trás de tudo, sonicamente, os enfeites cinematográficos desta canção estão amarrados a uma série de progressões de cordas humildes, mas poderosas, que mantêm tudo bem arranjado. Composta apenas por Madonna, Ghosttown parece mais focada na produção do que na tendência sonora, fazendo-a valer a pena.

A prazerosa Body Shop é outro presente do álbum. Madonna compara suas necessidades românticas à manutenção de um carro, que deve ser feita pelo amante na loja de corpos. “Inicie meu coração, você sabe o que deve fazer”, em um discurso metafórico e amável. Este é o som de uma cítara ou banjo? De qualquer forma, ele chega lindamente aos ouvidos. Não diferente de Ghosttown, ela é uma faixa na qual Madonna não se preocupa em se manter atualizada, e o resultado traz um certo frescor.

Claro, há os momentos ruins em Rebel Heart, no qual a propensão de Madonna em apelar ao mercado jovem faz a produção ser exagerada. Bitch, I’m Madonna, com participação de Nicki Minaj, traz um sintetizador presunçoso que coloca o ouvinte em uma emboscada, com o entusiasmo adolescente. Com letras do tipo: “Yeah, vamos beber e ninguém vai nos impedir”, a canção essencialmente usa o guia jovem como papel higiênico. Da mesma forma, em Unapologetic Bitch, o produtor Diplo afia a produção com alarmes delirantes, com as batidas reggaeton confiantes. “Abro garrafas que você não pode pagar. Dou festas nas quais você não vai entrar”, é uma ode travessa a alguém se validando contra um ex. O fim urgente remete ao que aconteceu recentemente com algum boy-toy, talvez Jesus Luz ou Brahim Zaibat. É lógico que Guy Ritchie pode bancar um champanhe caro.

Até mesmo entre as canções festeiras, Rebel Heart é um álbum amarrado com um violão exuberante e composições fortes. Um bom exemplo, que atesta tal qualidade, é a faixa-título Rebel Heart. Ela é uma balada melodicamente sofisticada, com um refrão que eleva o ouvinte a um plano maior. A instrumentação com cordas e uma percussão de apertar o coração ajuda a apoiar um vocal de Madonna que ecoa sabiamente da reflexão dela. A canção, tematicamente, é uma lembrança: “Então, pela estrada mais improvável eu segui. E, dela, viva, eu mal saí”.

Diferente de eras anteriores de Madonna, esta é absorvida na pronúncia de tudo o que ela já fez. O álbum explicita alegrias do legado dela, o que fica evidente nos títulos de canções como Iconic e Veni Vidi Vici. Nesta última, Madonna referencia alguns de seus próprios sucessos, em versos como “Eu me expressei, vim como uma virgem pela ilha… Abri meu coração e aprendi o poder do adeus. Eu vi um raio de luz e a música salvou minha vida”. Na faixa com a colaboração de Natalia Kills, Holy Water, ela ressuscita o rap de Vogue para comemorar sua História. E, depois de três décadas de importância na indústria da música, ela ganhou o privilégio de se divertir com uma herança tão rica.

Ninguém conseguiu o mesmo feito de Madonna na música Pop. Ninguém conseguiu uma carreira tão consistente. Rebel Heart pode ser curtido como um testamento à continuidade dela. Geralmente, o sucesso persistente na carreira de alguém, após um longo período, é socialmente considerado uma conquista digna de aplausos. Portanto, parece contraditório que os cínicos a arrastem a uma extensão da carreira. A percepção alternativa é simplesmente apreciar a música, facilmente como ela é, com Rebel Heart.

Indiscutivelmente, é o melhor lançamento dela em 10 anos. Esta é a nova era de Madonna. Se a atenção vai além da música, talvez seja o momento de perceber que o que ela está fazendo, como uma cantora Pop de 56 anos, é mudar o paradigma do que significa ser uma mulher de meia-idade. Todos vivemos mais, então permitamos que esta parte central de nossa vida seja mais abundante. Vejamos em Madonna um exemplo de como nos expressarmos livremente.

SameSame.co.au

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